Prefeitura tomba imóveis alemães históricos em ruínas na zona sul de SP
A maior parte desse patrimônio está ruindo devido à falta de manutenção
Igreja de Parelheiros
SÃO PAULO - Imigrantes alemães foram os primeiros moradores, no século 19, da região conhecida atualmente como Parelheiros, no extremo da zona sul da capital paulista. Pela importância histórica e cultural desses estrangeiros, que marcaram o bairro, dez imóveis ou conjuntos de bens históricos foram tombados.
O tombamento, decidido pelo Conpresp (Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo), foi publicado no Diário Oficial no dia 22. Agora, qualquer obra a ser feita nesses imóveis precisará de autorização do órgão.
Foram tombadas quatro casas, três igrejas, um cemitério e conjuntos que englobam uma via férrea, uma estação de trem, 22 casas de uma vila de operários, uma barragem e uma comporta.
Apesar do reconhecimento da gestão Bruno Covas (PSDB), a maior parte desse patrimônio está ruindo devido à falta de manutenção. O tombamento é visto pelos moradores como uma esperança de resgatar os monumentos e transformar Parelheiros em ponto turístico.
“Pode melhorar e atrair turistas”, diz o aposentado Rosalvo Brito, 86 anos. Ele mora em um pedaço de Parelheiros que parece ter parado no tempo, a Vila Ferroviária, em uma casinha simples, uma das tombadas no conjunto, ao lado da linha do trem de carga que passa pela estação Evangelista de Souza, desativada e pichada.
No restaurante Cantinho da Praça, uma casa amarela antiga e de janelas verdes, uma das proprietárias, a comerciante Paula Senna, 31 anos, não sabia ainda do tombamento, mas comemorou. “É excelente, porque a casa vira referência de arquitetura e engenharia. Fico mais entusiasmada em saber que trabalhamos em um lugar histórico”, diz Paula.
Cemitério de Parelheiros
Aproveitando a hora do almoço na frente da Igreja de Colônia Paulista, os primos Marcos Borba, 45 anos, e Emerson Reimberg, 40 anos, ambos carteiros, contam a história do patrimônio recém-tombado. “Foi construída pelos nossos bisavôs, o que nos deixa orgulhosos”, diz Reimberg. “Essa colônia foi formada por muitos de nossos parentes, que deixaram o estado Renânia-Palatinado, na Alemanha, e povoaram Parelheiros”, finaliza Borba.
A região mais central dos tombamentos, que inclui a paróquia, a igreja e as casas dos imigrantes, conhecida como Colônia, são terras doadas por Pedro Geraldo Schunck para a comunidade alemã, diz a arquiteta e urbanista Jaqueline de Araújo Rodolfo, que fez um estudo sobre o bairro na Universidade Mackenzie.
Jaqueline conta que foi de uma das tradições alemãs que o nome do bairro surgiu. “As corridas de cavalos nas estradas eram chamadas de parelhas”, conta. Outra curiosidade da região envolve o então imperador dom Pedro 2º. “Por conta de conflitos com indígenas, ele colocou esses alemães ali para ocupar a região”, afirma a arquiteta. Os primeiros moradores chegaram em 1823. “Inicialmente foram 149 famílias.”
Schunck nasceu em 1901 e viveu por 60 anos no bairro. Além de doar as terras, fornecia gratuitamente energia elétrica para a iluminação de Parelheiros. Ajudou ainda a fundar o primeiro posto de saúde do bairro e um clube de futebol.
O tombamento dos imóveis de Parelheiros pretende preservar a origem do bairro colonizado por alemães, trabalhadores agrícolas. É o que afirma Mariana Rolim, diretora do Departamento de Patrimônio Histórico da Secretaria Municipal de Cultura e conselheira do Conpresp.
“Não são os imóveis em si que são importantes, mas eles servem para entender a formação da área rural que pertencia ao antigo município de Santo Amaro, hoje um dos bairros da zona sul. Eles marcam a configuração original da área, que começou a receber imigrantes na década de 1820”, explica.
O caminho que leva à antiga casa de Joseph Roschel, imóvel tombado conhecido como o Casarão do Jusa, é uma estrada de terra. Datada de 1841, tem metade do telhado destruído pelo tempo. Uma parte do assoalho caiu.
Apesar disso, a casa, com paredes grossas, não tem fissuras aparentes. Foi ali que nasceu o aposentado Gentil Roschel da Silva, 63 anos, bisneto de Joseph, o Jusa.
Silva morou ali por 40 anos com a mãe e os 14 irmãos. Ele conta que a casa, hoje trancada, tinha 14 cômodos, cinco quartos e duas salas grandes. “Quando éramos crianças, brincávamos de esconde-esconde no porão. Depois passei a trabalhar na roça e a nossa diversão aos sábados era dançar forró na casa. Muitas lembranças boas. É uma vida aqui, né?” Ele saiu de lá quando sua mãe morreu. Agora, aprovou o tombamento. “É muito importante, até porque a casa é linda e toda original. Mas queríamos ajuda para restaurar, porque a família não tem condições.”